Sociedade dos Poetas Mortos: que professor eu quero ser?

Em tempos de pandemia, o professorado teve que reinventar-se em sua didática e na abordagem comunicativa, adaptando-se às ferramentas disponíveis para as exigências do momento. Mas, apesar das duras provas impostas aos docentes para demonstrar suas habilidades no uso das chamadas TIC – tecnologia da informação, a paixão pelo ensinar parece muito mais acesa e criativa. O texto a seguir foi publicado, originalmente, em 2014, no blog Rosa de Castela, após a morte do ator Robin Williams. Mas suas reflexões sobre a atuação docente continuam atuais.

“Sociedade dos Poetas Mortos” (Dead Poets Society), filme de Peter Weir, produzido em 1989 e lançado no ano seguinte, nos cinemas do mundo inteiro, alcançou grande sucesso de público, à época. Contudo, podemos dizer que o enredo continua atual, ultrapassando os limites do tempo, fato que se espera de toda obra clássica, seja na literatura, no cinema ou nas artes em geral.

A história ambientada em uma tradicional escola americana, a Welton Academy, no ano de 1959, retrata não apenas a ortodoxia da administração escolar quanto à formação de seus alunos, mas também os métodos aplicados na transmissão do conteúdo das disciplinas.

O ponto crucial da trama versa a respeito do contraste entre tradição e inovação; imposição e conquista. A figura do mestre temido pelos alunos dá lugar à imagem do docente que opta por uma metodologia de ensino menos ortodoxa e imperativa, brilhantemente interpretado por Robin Williams na pele do professor de literatura inglesa, John Keating.

A postura de Mr. Keating, como era chamado pelos alunos, revela um professor apaixonado pela arte de ensinar e que, ao invés de seguir a tradição, a honra, a disciplina e a excelência, os quatro pilares norteadores da filosofia pedagógica de cuja escola também fora aluno, prefere conquistar seu alunado de forma inovadora, baseando-se no lema “carpe diem” (aproveite o dia), trazendo a baila uma reflexão sobre a missão do professor e seu método particular de atuação em sala de aula.

Keating primava pela busca prazerosa do conhecimento e não pelo enfado do estudo por obrigação; trazia em si o furor, a paixão, a vivacidade e a inquietude tão próprias dos revolucionários, que se rebelam contra todo o tipo de ditadura, cujo método de ensino só se fazia por meio da opressão, do castigo, da intolerância, e do encaixotamento do saber. Na visão de Keating, o aluno deveria pensar por si próprio, e não apenas aceitar o conhecimento pronto, acabado, limitado.

Literatura, a disciplina ensinada, ou melhor, vivenciada por Mr. Keating, é um campo fértil à disseminação de ideias e ideais, do afloramento das paixões, do tratar de temas simples do cotidiano que, movidos pela paixão, transformam o indivíduo e, assim, a sociedade e, consequentemente, o mundo. “É preciso saborear as palavras”; “Palavras e ideias podem mudar o mundo”, dizia aos alunos. “Carpe diem. Não esperem suas vidas chegarem ao fim para perceberem que não souberam aproveitá-las e que não deixaram sua marca no mundo.”

Mudar a perspectiva, a forma de olhar as coisas também é outro lema da personagem, e que serve como base para nós professores refletirmos sobre o nosso papel no mundo da educação, hoje. Então, começo com algumas indagações: que tipo de professor eu sou ou quero ser? Que diferença faço ou pretendo fazer na vida de meus alunos? Que perspectivas e que caminhos posso mostrar-lhes? Sigo os métodos ultrapassados da opressão e do medo, ou busco a conquista pelo respeito à individualidade e à opinião de cada um daqueles cujas vidas cruzaram com a minha para que eu pudesse cuidá-las durante um determinado momento? Qual é, afinal, a minha missão nesse caminho?

Em algum lugar… Em algum ou em muitos momentos, tivemos, enquanto alunos, algum, ou alguns, Keatings em nossa vida acadêmica. Se olharmos para trás e nos lembrarmos desses mestres apaixonados pela arte de educar, mais que simplesmente ensinar, perceberemos que eles descobriam talentos, faziam com que tomássemos ciência de nossas habilidades; faziam com que nos desafiássemos, quebrássemos nossos próprios limites, acreditando ser possível concretizar o impossível; acreditando ser possível, pela trilha do autoconhecimento, da não ortodoxia e da inovação, caminharmos com as próprias pernas. Assim, diante da lição deixada por Keating, como professora, é esse Keating que eu quero ser.

Por Sandra Caldas Lourenço

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